Este texto se trata de uma adaptação ao artigo "POLÍCIA MILITAR E O DIREITO DE GREVE" de Antônio Álvares da Silva, Professor titular da Faculdade de Direito da UFMG.
A Constituição de 88, quase na virada do século vinte, proibiu a greve e a sindicalização do militar - art.142, IV. Discriminou assim uma categoria de trabalhadores, impedindo-a de defender seus direitos, a exemplo das demais que se servem da sindicalização, convenção coletiva e greve para este fim.
O erro do legislador constitucional é evidente. Fez concessão ao atraso e não compreendeu os novos tempos. O conceito de trabalhador é um só: cidadão que, não sendo proprietário dos meios de produção, "vende" ao empregador, pessoa física ou jurídica, seu trabalho que se transforma em valor econômico, com o qual garante a subsistência própria e da família.
Se o empregador é o Estado, isto pouco importa. O trabalho não muda, por isto, sua natureza de meio garantidor da sobrevivência digna daqueles que o exercem. Logo, o militar deve ter naturalmente todos os instrumentos jurídicos para defender seus direitos e participar do jogo democrático da divisão de riquezas, que ele também ajuda a construir. Se é impedido de agir, reprimem-se aspirações e desejos que, num dado momento, vão sopitar como força indômita, transformando-se em violência pela falta dos instrumentos jurídicos que a canalizem.
A Convenção 87 da OIT, que cuida da liberdade sindical e do direito de sindicalização, desde 1948, prescreveu, do alto de sua experiência e sabedoria, que as leis locais determinarão sobre sua aplicação aos membros das forças armadas, das polícias e bombeiros militares. Portanto, ao contrário dos que muitos pensam, nunca proibiu a greve destas categorias. Apenas relegou a questão ao direito interno de cada país.
A vida reage quando o legislador é injusto e os fatos podem mais do que as leis. Já não é a primeira vez que nossas polícias e bombeiros militares fazem greve. Como não tem canais jurídicos para levar suas reivindicações ao Estado, há casos que partem para a violência, destroem carros, invadem prédios públicos e tudo o mais que é possível para se fazerem ouvir.
O exemplo foi vivido na Bahia. Em vez de abordar o assunto de forma dialogada e democrática, convocando as partes à negociação, juízes da justiça comum, que não tem experiência no setor, trataram o problema como crime, determinando abertura de inquéritos e prisões.
Do ponto de vista formal, estão certos. Se a greve de PMs é proibida, quem a pratica incorre em ilícito e se torna passível de punição. Acontece que a norma está superada e se atrita com os tempos atuais. Daí a perda de sua força pelo desuso e pelo anacronismo. Os juízes, mesmo sem lei que os autorizem, não fazem greve, embora com técnica diferente?
Entre estas duas forças, a da lei arcaica e a dos anseios populares de uma classe trabalhadora, nasce uma profunda tensão que pode transformar-se em violência e sangue se não houver bom senso das autoridades na busca de uma solução.
É preciso que o Congresso aja com rapidez e sabedoria, removendo da Constituição esta proibição absurda e permitindo às Polícias, Bombeiros Militares e às Forças Armadas o direito de greve. Eles são trabalhadores, servidores públicos como quaisquer outros e não podem ser discriminados. Se a Polícia Civil, que é um setor da polícia, como conceito geral, pode fazer greve, torna-se difícil entender por que ao outro setor ela seja proibida. Acaso não faz parte do mesmo todo?
O certo é revogar a proibição constitucional, dar competência à Justiça do Trabalho, que é o Judiciário treinado para resolver este tipo de conflito, para que, em sentença arbitral definitiva, decida-se entre o que o Estado oferece e o trabalhador militar pede.
Nada pior para um povo do que uma norma que o tempo revogou. Ela se transforma em instrumento de opressão e não de libertação. Oxalá o mal vivido pelos baianos não se alastre pelo país. A lei deve ser um instrumento da ordem e não do caos. O bom senso deve imperar antes que o sangue seja derramado
UNICA-BASE FORTE
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